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Potencializando o uso das infraestruturas públicas digitais (IPD) no Brasil

Por Camila Murta, Sr. Procurement Specialist na AWS

A Lei 14.129/2021 trata sobre princípios, regras e instrumentos para o Governo Digital e para a eficiência pública, especialmente por meio da desburocratização, da inovação, da transformação digital e da participação do cidadão.

Recentemente o Governo Federal publicou uma consulta pública para atualizar a Estratégia Nacional do Governo Digital para o período de 2024 a 2027 e, trouxe, pela primeira vez, o termo infraestruturas públicas digitais – IPD, defindo-as como: ‘’soluções estruturantes, transversais a várias políticas públicas, que adotam padrões de tecnologia em rede, construídos para o interesse público, que permitam escala universal, e viabilizam a orquestração de usos por diversos intervenientes, dos setores públicos e privados, de forma integrada em canais físicos e digitais, governados por arcabouços legais aplicáveis e regras habilitadoras para promover desenvolvimento, inclusão, inovação, confiança, competição, respeito aos direitos humanos e liberdades individuais’’.

Em outras palavras, os IPDs são infraestruturas de uso compartilhado que facilitam interações digitais públicas eficientes e seguras entre o governo e os cidadãos. As IPDs promovem a inovação do setor privado, aumentam a participação dos cidadãos na economia, proporcionam inclusão digital e impulsionam o desenvolvimento sustentável do país. É, portanto, um facilitador essencial da transformação digital.

Os recursos digitais fundamentais dos IPDs não são exclusivos de um país, empresa ou entidade pública. A grande vantagem é que, quando o IPD é publicado sob uma licença aberta, muitos outros podem reutilizar e adaptar a solução, representando uma economia significativa de tempo e dinheiro. Além disso, promove uma prestação de serviços públicos mais consistente, mais inclusivo, redução das possibilidades de vazamentos e fraudes e propicia maior agilidade e capacidade de resposta diante de mudanças e crises.As Nações Unidas chamam de pilha de tecnologia cívica os três principais tipos de protocolos que facilitam a infraestrutura pública digital: identidade digital, pagamentos digitais e troca de dados[1]

E o Brasil tem alguns excelentes exemplos deles. Na camada de pagamento, o Banco Central do Brasil desenvolveu o PIX, para permitir pagamentos e transferências instantâneas. O PIX revolucionou as transações financeiras no país e foi replicado em vários países desenvolvidos.

O PIX, experiência promovida pelo Banco Central do Brasil (BCB), é uma tecnologia criada para viabilizar, de forma instantânea, pagamentos e transferências. Implementado a partir de 2020, em menos de três anos já viabilizou a realização de, aproximadamente, R$3 bilhões de transações financeiras e já promoveu economia de R$6 bilhões para consumidores e empresas que o utilizam. (CIEB, 2023)

Outro caso brasileiro relevante a ser citado é o sistema do CadÚnico que foi determinante para que o Brasil pudesse ter um dos maiores programas de transferência de renda do mundo, o Bolsa Família, e também pudesse beneficiar de forma emergencial mais de 68 milhões de brasileiros durante a pandemia da Covid-19.

E, por fim, um caso brasileiro que merece ser referenciado é a plataforma única de acesso a informações e serviços gov.br, que através do login único facilita a interoperabilidade — termo que se aplica à obtenção automática de dados entre os órgãos do governo  — evitando a repetição desnecessária de pedidos de documentos e informações ao cidadão e aprimorando a gestão das políticas públicas.

A plataforma gov.br permite que 152 milhões de cidadãos tenham acesso a quase 5 mil serviços digitais, simplificando a vida dos usuários para o acesso ao sistema de sáude, previdenciário, trabalhista, social, dentre outros.

https://www.gov.br/governodigital/pt-br/conta-gov-br

Mas se as IPD são relevantes, necessárias, replicáveis, promotoras do fomento da economia e da inclusão digital do cidadão por que ainda pouco divulgadas no Brasil?

A resposta está na resistência do governo em superar obstáculos como: i) infraestrutura tecnológica obsoleta; ii) falta de habilidades e acesso digital; iii) falta de colaboradores técnicos treinados; iv) falta de recursos financeiros focados em tecnologia; v) regulamentações digitais desatualizadas com o progresso tecnológico; vi) falta de vontade política; vi) a não centralidade do cidadão; e outros

Necessita-se, portanto, de uma atuação coordenada e estratégica do setor público e privado visando superar resistências e trazer à sociedade os benefícios da implementação das IPD. E tais mudanças somente ocorrerão com a mudança de comportamento, de processos internos, de governança, abraçando as novas possibilidade para inovar.

Nesse sentido, o Governo Federal Brasileiro tem dado sinais de que quer a colaboração do setor privado para o impulsionamento das IPD. Veja que a Lei de Governo Digital, bem como a Estratégia Nacional de Governo Digital, exaltam o uso de dados abertos, do governo como plataforma, da interoperabilidade, do uso da internet, de tecnologia, de padrões e de formatos abertos e livres.

E, complementariamente, a Lei 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos) traz com um dos seus objetivos a promoção da inovação e do desenvolvimento nacional sustentável, além de fomentar a participação do mercado em soluções inovadoras e tecnológicas.

E ai que entra os serviços em nuvem. A nuvem se tornou o grande indutor da jornada de transformação digital, reforçando a mudança de paradigma da forma como a tecnologia da informação é pensada, gerenciada e estruturada, permitindo ganho de eficiência, agilidade, segurança e redução de custos.

A adesão das tecnologias em nuvem foi definida como prioridade pelos gestores públicos federais, a exemplo cita-se a consulta pública realizada pelo Ministério da Gestão e Inovação para a Ata 3.0 que abarcará a aquisição centralizada de serviços em nuvem para os órgãos integrantes do SISP (total de 52), além de outros que se interessem na adesão da ata.

Portanto, a crescente adoção da nuvem também abrirá espaço para inovação, especialmente no contexto de infraestruturas públicas digitais . A intensificação do uso da nuvem na gestão pública pode catalisar o desenvolvimento de ecossistemas de inovação e colaboração entre o setor público, empresas privadas e a academia. Isso pode levar a parcerias estratégicas e iniciativas conjuntas que impulsionem o desenvolvimento de soluções tecnológicas inovadoras para desafios específicos enfrentados pelo governo, promovendo assim o avanço da IPD.

Em resumo, a intensificação do uso da nuvem na gestão pública em 2024 não apenas transformará a maneira pela qual o governo adquire e fornece serviços de TI, mas também abrirá novas oportunidades de inovação e colaboração no desenvolvimento de infraestruturas públicas digitais mais eficientes, ágeis e centradas no cidadão.

A boa notícia é que temos todas as ferramentas, só precisamos começar!

 

Fontes:

https://cieb.net.br/conecte-c-aborda-infraestrutura-publica-digital-a-luz-da-educacao/

https://coachingcarreiras.com.br/o-caso-para-investir-em-infraestrutura-publica-digital/

https://www.weforum.org/agenda/2022/08/digital-public-infrastructure/

https://www.undp.org/pt/brazil/news/tecnologias-digitais-beneficiam-diretamente-70-das-metas-dos-ods-afirmam-uit-pnud-e-parceiros

https://apolitical.co/solution-articles/en/how-digital-public-infrastructure-can-catalyse-development

https://brasilparticipativo.presidencia.gov.br/processes/ENGD/f/77

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14129.htm

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14133.htm

[1] United Nations, Building & Securing Digital Public Infrastructure Playbook, June 2022


Sobre a autora

Camila Murta é Advogada, especialista em Direito Público Municipal, pós graduada em Direito Constitucional e Administrativo, MBA em Gestão Pública, especialista em Gestão de Tecnologias Digitais, formada em Governança Corporativa, certificada em Ética e Compliance e Certificada em Serviço em Computação em Nuvem pela AWS. Autora de livros e artigos na área jurídica